Todas as vidas são feitas de estradas. Largas, estreitas, sinuosas, rectas – com pequenos entroncamentos, às vezes apenas uma rua entre as artérias principais. A maior parte das vezes, dividindo estas avenidas em três: família, trabalho e o tempo que se convencionou chamar “livre”. Mas depois há afortunados que confundem tudo num vaso único, sustentado no caule da salutar obsessão. Assim Desmond Morris.
Partindo da oferta do seu arquivo científico ao Museu de Ciência e História Natural da Universidade do Porto e das edições que, na chancela Arte e Ciência, se fizeram inicialmente da sua extensa obra, vamos percorrer essa estrada única, percebendo onde se cruza o seu labor com o que nos parece mais habitual a nós, comuns mortais.
Morris é imortal, diga-se. O seu trabalho na etologia – não só a humana –, de estudo e divulgação, ficará para sempre entre o conhecimento mais abrangente da nossa espécie.
Mas não só no conteúdo – também na forma, aquela com que cumpriu 95 anos de uma vida cheia, tocando os pontos certos numa vereda única.
Morris é um obsessivo. A partir da edição de O Macaco Nu iremos perceber o seu fascínio pelo nosso comportamento e como esse fascínio moldou uma vida dedicada ao comportamento de todos os animais. A partir da A Tribo do Futebol perceberemos como um afastamento infantil do jogo mais conspícuo do mundo foi, quando levou o filho, já adulto, a um estádio, o fascínio pela dança e por tudo o que envolve 22 pessoas atrás de uma bola. A parte de O Macaco Criativo perceberemos como a etologia se incorporou na sua arte surrealista, imitando a vida e as obsessões que o iam perseguindo. E, finalmente, através de Observar perceberemos como até a vida mais privada foi sempre vivida com a ideia colaborativa de um trabalho conjunto – no caso, com a sua esposa Ramona.
Tudo, em Morris, é a mesma coisa. Tudo são ramos de uma estrada única, onde trabalho, família e ócio foram sempre o mesmo. Não há passatempos, não há vida familiar que não seja, também ela, contaminada pelo seu trabalho, pela sua curiosidade.
Para Morris tudo é curiosidade. E é esse o nome da sua avenida. Everything is Wonder.
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